Arquivos

João Fênix revê repertório afetivo

O cantor e compositor pernambucano João Fênix chega ao quinto trabalho olhando para sua formação. No CD De volta ao começo, lançado pela Biscoito Fino, Fênix – como era conhecido no inicio da carreira – põe o coração na voz e manda recados através de canções maturadas durante a vida.

Com 20 anos de carreira, no início dos anos 2000 Fênix chamou atenção atuando entre a música e o teatro com seu raro timbre de contratenor e interpretação forte no palco. As inevitáveis comparações com Ney Matogrosso nunca foram evitadas – ao contrário: os dois cantam juntos no primeiro disco de Fênix uma composição de Patricia Mellodi: “Mãe vê se explica pra eles / Tudo aquilo que você me ensinou”. A carreira seguiu entre Brasil e EUA – onde vive – alternando estilos e nuances. O que volta a acontecer nesse disco, que tem produção dividida entre Jaime Alem e Jr. Tostói. Essa inusitada sintonia entre artistas de universo tão distantes é alimento para o cantor.

Fênix se apropria das músicas e também dos versos que abraça. Em Minha casa, composição de Zeca Baleiro que abre o disco, já se coloca em ambiente confortável: “sentado na porta de minha casa / a mesma e única casa / a casa onde eu sempre morei”. Já em A feminina voz do cantor, de Milton Nascimento e Fernando Brant, deixa claro “Feminino é o dom / Que o leva a entoar” para finalizar com o belo verso “As vozes que ensinaram: bom é cantar”. Ele tem razão e se impõe com graça.

O repertório afetivo de Fênix passa pelo terreiro de Pixinguinha e Gastão Vianna com Yaô, pela boemia de Noel Rosa em Último desejo, pelo samba de Nelson Cavaquinho em Minha festa e pelo nordeste de Luiz Gonzaga e Zé Dantas em Riacho do navio.

Ao mesmo tempo tem a canção do interior por Elomar em Arrumação e a tropicália de Gilberto Gil – ousando e arrasando em Língua do P. Ainda dessa rica geração traz Gonzaguinha (De volta ao começo que batiza o álbum) e Caetano Veloso (Motriz). A parceria de Gilberto Gil e Chico Buarque segue a temperatura das discussões políticas atuais. Sua Cálice tem coro de Estudantes e discurso de Jean Wyllys.

Comparações de lado, João Fênix é artista único. Se sua discografia não é linear, esse desenho é uma vantagem. Fênix chega nesse novo trabalho promovendo misturas que fazem todo sentido em sua persona artística. O intérprete volta para sua casa. Confortável mas sempre inquieto.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *