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O tempo de Áurea

Em 2022 o fio de luz que ilumina o fim de tempos muito difíceis acena com o brilho de Áurea Martins.  A cantora carioca lança um luxuoso álbum que faz justiça com sua história e personalidade. “Senhora das folhas” com direção musical de Lui Coimbra – produzido com patrocínio do projeto Natura Musical e editado pela Biscoito Fino – mostra o tamanho de uma artista contemporânea e em pleno movimento aos 81 anos de idade e mais de 50 de carreira – grande parte deles quase invisível para o público do lado de fora do ambiente das boates cariocas.

 

Áurea passou muitos anos sem a projeção que merece, cantando em boates e bares e sem registrar sua voz. Essa história muda em 2008 quando começou a gravar pela Biscoito Fino projetos assinados por Hermínio Belo de Carvalho. Pouco antes uma nova geração de artistas que circulava pela Lapa carioca descobriu e abraçou a cantora, elegendo Áurea como uma espécie de mãe/professora/protetora. Generosa e de alma livre, Áurea estabeleceu um diálogo natural com esse grupo e com eles também abraçou o samba – até então novidade em seu repertório. Ela faz parte da turma. Hoje, ativa nas redes sociais, não deixa de publicar suas opiniões sinceras, posicionamento humano e celebrar colegas artistas formando um círculo de admiração, de carinho e de verdade.

 

Não por acaso, a bela voz de Moyseis Marques – um dos expoentes dessa geração de artistas – está ao lado de Áurea em “A rezadeira”, composição do rapper Projeta reconstruída e incluída nesse novo álbum. Outro artista dessa geração – mas não parte dessa turma da Lapa, mais ligada ao samba – que aparece no álbum é o cantor e compositor André Gabeh, na bela “Araruana”, de Marlui Miranda e Nahiri Asurini, que entra com o poema “Vô Madeira”, de Julie Dorrico. É lindo como Áurea dá voz a uma canção da jovem pernambucana Flaira Ferro em “Me curar de mim”: “Fiz em mim uma faxina / E encontrei no meu umbigo / O meu próprio inimigo / Que adoece na rotina”, diz a letra composta por Flaira aos 23 anos e registrada com beleza por Áurea aos 81.

 

Cânticos religiosos estão desde a abertura do álbum e seguem ao longo das onze faixas. Rezadeiras, curandeiras e benzedeiras são o fio condutor desse trabalho. Os primeiros versos na voz da cantora dizem “Salve, salve a fé no amor / Que cura tudo, o mal, a dor / Salve salve o ramo sagrado / A natureza foi quem gerou”. A letra de “O ramo”, de Socorro Lira, dá a deixa para o mergulho de Áurea nessa viagem de fé e história.

 

Em “Senhora das folhas” a cantora, que durante sua carreira na noite foi mais associada ao samba-canção, mostra que seu interesse é amplo e sua voz não tem medo de se reinventar. O álbum – com direção artística da produtora Renata Grecco – traz em 2022 a essência e a ancestralidade da artista negra da zona oeste carioca que surgiu para o público em 1969 vencendo o programa “A Grande Chance”, de Flávio Cavalcanti.

 

Cinco décadas mais tarde, o novo disco celebra Áurea Martins, mulher/ativista/artista de ouvidos atentos, braços abertos para o novo se sem limites no horizonte. Sua voz canta a sua verdade, com emoção. “Senhora das folhas” é o trabalho que mostra o tamanho dessa artista.

 

SHOW DE LANÇAMENTO

Data: 05 de abril de 2022 (terça-feira), 20h

LOCAL: Teatro Prudential
Edifício da Manchete – Rua do Russel, 804 – Glória

Tel.: (21) 3553-3557

 

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