Cantora, compositora, atriz, pensadora, ensaísta. A arte de Beatriz Azevedo não cabe em rótulos. Seu novo CD, antroPOPhagia, traz essa mistura inquieta e estimulante. Gravado ao vivo em Nova York em dezembro de 2012, o quarto álbum da cantora ganha edição pela parceria da Biscoito Fino com o Sesc e Musicoteca.
O título do disco já traz suas cartas: tem a influência do teatro de Zé Celso Martinez Correa, as parcerias com Oswald de Andrade, a menção a Pagu, o baile de carnaval. Convidada para estrear o show no prestigiado Lincoln Center, Beatriz não pensava ainda em um registro. A gravação aconteceu por iniciativa do técnico de som que providenciou o equipamento e entregou depois. O show, com direção musical do maestro Cristóvão Bastos, fez parte da mostra Celebrate Brazil.
O repertório busca retratar um Brasil sem os clichês de sempre. Pesquisadora da obra de Oswald de Andrade, Beatriz estabelece parcerias com o escritor modernista a partir dos poemas Relicário, Cântico dos cânticos e Erro de Português. Essa abre o disco descobrindo uma nova história: “Quando o português chegou / Debaixo duma bruta chuva / Vestiu o índio / Que pena! / Fosse uma manhã de sol / O índio tinha despido / O português”.
Beatriz ainda assina parcerias com Vinicius Cantuária (Devora e Alegria, faixa título do álbum anterior da cantora), Matheus von Krueger (Tudo está), Deni Domenico (Bis) e Angelo Ursini (Dias lentos e Toda sorte). Em Coco de Pagu volta a visitar a poesia modernista, dessa vez na obra de Raul Bopp; sozinha assina a marchinha de carnaval Egoísta. Apenas duas releituras entram no repertório, mas não escampam do Manifesto Antropofágico: a bossa Insensatez, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, vira um tango com arranjo da própria Beatriz. Assim como What is this thing called love, que traz Cole Porter para o Brasil com um jongo transviado.
Pós-tropicalista mas bebendo na mesma fonte do movimento musical, Beatriz Azevedo constrói uma obra muito particular. Nada ali é gratuito, tudo aparece amarrado e buscando referências e idéias, reciclando e recriando. Música que faz pensar. AntroPOPhagia é manifestação de toda essa efervescência em forma de música.