A voz de Elis Regina continua forte, presente e mandando recados pertinentes ao Brasil 2022. Para lembrar o aniversário de 77 anos da cantora, a Universal Music traz uma nova edição do álbum “Falso brilhante”, com áudio remasterizado, opções em Dodly Atmos (tipo de mixagem imersiva, ainda disponível para poucos) e CD em versão deluxe com pôster.
Lançado originalmente em 1976 com direção musical de César Camargo Mariano, é um dos títulos mais importantes da discografia de Elis Regina. Baseado no histórico show que a cantora apresentou entre dezembro de 1975 e fevereiro de 1977 no Teatro Bandeirantes (São Paulo), o disco foi gravado em apenas dois dias aproveitando um intervalo entre as apresentações. Das 42 canções no espetáculo, dez foram para o disco.
Ao longo dos anos “Falso brilhante” se manteve como um dos clássicos da música brasileira, e quando completou 30 anos de seu lançamento já teve um trabalho semelhante ao atual com nova mixagem e opção de áudio 5.1 em lançamento da gravadora Trama. Nessa edição de 2006 uma etiqueta anunciava – o que pode ser uma surpresa estranha para as novas gerações – “Todas as vozes de Elis foram gravadas numa única tomada, sem emendar. Nenhum programa para afinar ou editar cantores foi utilizada na sua voz. A performance é real”. As duas reedições – que incluem ruídos e papos do ambiente do estúdio – são coordenadas por João Marcelo Bôscoli, filho de Elis e principal responsável pelo contínuo movimento do nome da artista.
A cada nova edição “Falso brilhante” se mostra mais presente e importante. Em um mundo que dá ainda espaço a movimentos conservadores e a censores, a voz de Elis está viva e parece gritar com a urgência de hoje versos como “Mas é você que ama o passado / E que não vê / Que o novo sempre vem” ou “O que há algum tempo era novo, jovem / Hoje é antigo / E precisamos todos rejuvenescer”, dos clássicos “Como nossos pais” e “Velha roupa colorida”, ambas de Belchior. Em “Jardins da infância”, os autores João Bosco e Aldir Blanc usam brincadeiras de criança para denunciar claramente a tortura, desaparecidos e a sociedade que aplaude em silêncio: “O dragão comendo gente / E a bela adormecida sem acordar / Tudo o que o mestre mandar”.
“Falso brilhante” não era um espetáculo necessariamente político, mas sob pretexto de contar a vida da cantora, cutucava na força inquieta de seu canto assuntos da época – inevitável desviar, a arte sempre vai incomodar. Para falar sobre as ditaduras da América Latina, traz duas músicas em espanhol: “Gracias a la vida”, de Violeta Parra, e “Los Hermanos”, de Ataualpa Yupanqui que diz: “Yo tengo tantos Hermanos / Que no los puedo contar / Y una hermana muy hermosa / Que se llama / Libertad”.
Se “O passado é uma roupa que não nos serve mais”, a história mostra como “Falso brilhante” permanece atual, precioso. A nova edição é momento para colocar o melhor fone nos ouvidos e aumentar o volume.