“A pele do futuro ao vivo”, novo DVD de Gal Costa, é um passo adiante do disco gravado em estúdio em 2018. Lançado pela gravadora Biscoito Fino, o registro do show feito na Casa Natura Musical dá a energia que parece que faltou ao álbum. A voz de Gal Costa está mais viva e brilha no encontro com o público paulistano. É quente, feliz e pulsante ao mandar recados pertinentes.
Desde que passou a apontar seu presente com olhos na rica produção da década de 70, Gal se reconectou com um público jovem interessado em seu trabalho. Uma luz tropicalista iluminou uma Gal que voltou a ousar, arriscar desde que os timbres eletrônicos vestiram o álbum “Recanto”, produzido por Caetano Veloso em 2011. Assim palcos como do Circo Voador (Rio) ou Casa Natura (São Paulo) são abrigos confortáveis para esses encontros. A geração tropicalista arrombou portas, destruiu preconceitos e segue surfando na rebeldia, levantando a bandeira da liberdade.
Em tempos conservadores, de retrocessos, o verão de 71/72 soa ainda mais moderno, rebelde e importante. Gal continua gritando: “Eu sou amor da cabeça aos pés”. A música “Dê um rolê” de Moraes Moreira e Galvão – um dos grandes destaques do antológico show “Gal a todo vapor” – abre o novo DVD. Mas o passeio pela carreira de Gal dessa vez chega ao repertório popular da década de 80, incluindo um irresistível medley de frevos que fecha o álbum e a balada “Chuva de prata”, que tomou de assalto as FMs populares em 1984.
Gal é ciente de sua história e importância para a música brasileira. ” Sou filha de todas as vozes que vieram antes / Mãe de todas as vozes que virão depois”, canta em “Mãe de todas as vozes”, composta por Nando Reis. Nesse roteiro livre de regras ela pode voltar a uma antiga parceria de Jorge Mautner e Nelson Jacobina (“Lágrimas negras”) ou trazer uma releitura para um sucesso de Fabio Jr (“O que é que há”, que também ganha versão bônus gravada em estúdio). Mergulha no clima da disco brasileira com “Sublime”, de Dani Black, e ousa até trazer para essa pista uma música do repertório de Marília Mendonça com ótimo resultado em “Cuidado de longe”.
Com liberdade Gal Costa usa a sua história para se reinventar. Sua discografia não é linear, tendo desde trabalhos ousados, outros comerciais até fases mais tradicionais enfileirando releituras de standards. Mas ela é corajosa o suficiente para, com mais de 70 anos, se colocar novamente como instrumento de resistência. “E o leite mau na cara dos caretas”. Tá dito.